quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

CAPITULO XXIV
Já se aproximava a hora do jantar, Dona Margarida saiu daquele quarto, e fora até a cozinha, Dalila pela primeira vez desde a estadia naquela casa, não era muito de querer ajudar nos afazeres domésticos. Com os olhos baixos, nem percebera quando a mãe chegara à cozinha. A mãe a observava, aquele olhar era não mais do que de condenação, sentia vergonha de ter uma filha com aquele tipo de coragem, a coragem de desrespeitar o outro, a coragem de fazer pouco próprio sacrifício, tanto brigara pelo amor daquele homem para depois jogar fora não com um, mas com vários desejos de momento.
  Mas Dalila não pensava assim, gastava mais seu tempo pensando nela mesma.
  Eis que o jantar estava na mesa, e logo depois de se sentarem Dalila e a mãe, chegaram Hanz e Jorge, o primeiro ainda sem saber ao certo o que acontecia, o que atordoava tanto Dona Margarida, e o que afligia tanto sua amada, a ponto de esta ficar tão ressabiada. Ele, Hanz foi o primeiro a ser servido, seguido de Dona Margarida e por fim Jorge. Era costumeiro que servisse primeiro a matrona. Mas não Dalila tinha um fetiche pela afronta. Isso não era novidade para ninguém.
  Jantavam em silêncio. Hanz, inocente como nunca fora, ou pelo menos nunca pareceu ser, até tentou puxar conversa com Dona Margarida, que era sempre bem conversada, mas não adiantava, ela se mantinha resistente. Na verdade o seu coração de mãe, era no mínimo desconfiado, não conseguia mais ver Hanz como um bom homem, tinha medo de algum envolvimento dele mais a finco com seus filhos.
  Alguns dias se passaram, e o contato da mãe e a filha não era assim tão proveitoso, e nada harmônico. Era noite e todos dormiam, exceto Dalila e Hanz, que aproveitam enquanto os outros dormiam , para “conversar”.
  E nem perceberam que estavam sendo olhados, e quem olhou sentiu não mais do que ódio, daqueles dois, por mais que desconfiasse, a certeza lhe atordoava. A insegurança certamente lhe trazia dúvidas. Nem Hanz nem Dalila percebia a presença de ninguém, apenas sentiram ter alguém, quando escutara o barulho de um objeto cair ao chão, seguido de passos rápidos.
  Neste momento, tanto Dalila quanto Hanz ficaram ariscados, ficaram um  tempo ali parados olhando um para a cara do outro. Mas depois de um tempo cada um foi para o seu aposento dormir.
  O resto daquela noite fora no mínimo tenso, nenhum nem outro sabiam o que aconteceria na manhã seguinte. Mas na manhã seguinte nada aconteceu. Nem durante todo aquele dia. Porém ao cair da tarde, quando Hanz e Jorge voltaram do serviço, encontraram nada mais do que as malas, ou melhor, algumas peças de roupa dele, em um saco. Ele já imaginando do que se tratara, nada disse. Dona Margarida foi bem franca, a dizer-lhe que só queria uma coisa: que ele fosse embora dali, não dali a algum tempo, mas imediatamente. Ele, claro nada alegou, sabia que estava errado, realmente fora abusivo, aproveitou-se demais do que lhe foi oferecido, era digno de expulsão. Ainda, antes de sair, deu um forte abraço de agradecimento em Dona Margarida que se manteve imóvel. Jorge permanecia calado perto do portal da saída, e a única coisa que expressava era algumas lágrimas caindo sobre o rosto.
  Hanz já ia saindo, quando Dalila chegou na sala com sua bagagem:
- Espere, se vai você, irei eu junto.
- Dalila, você sabe que não pode vir, não tenho nada a lhe oferecer.
- De você só quero uma coisa, o seu amor.
- Eu sei, muito romântico, mas não há amor que resista à fome, ao acalento.
- Não existe amor se não for verdadeiro. E o amor verdadeiro tudo supera. Eu superarei tudo com você meu, só meu amor.
  Nisso a própria Dona Margarida, disse:
- Não vai aceita-la? Aceite-a, tu sabes quem ela é?
- Vamos Dalila, mudei de ideia, não posso deixa-la aqui, se nem sua mãe está do seu lado, o que será de você? Se é para sofrer, sofra, mas sofra comigo que só quero seu bem.
  Dalila não pensou duas vezes, abraçou aquele homem, enquanto isso, Jorge saiu daquela sala, Hanz não mais o viu, nem para uma despedida, um agradecimento.
 Para Dona Margarida disseram não mais do que um adeus, e saíram Hanz, Dalila, Tíbia e o velho Alazão. Rumo a uma nova vida.
  Uma nova vida, não fácil, mas determinante no futuro de cada um. 

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

CAPITULO XXIII

  CAPITULO XXIII
  Diana se aproximava daquela casa, não era primeira vez que sentia receio de ir até lá, e mais do que receio, era como se algo a puxasse para lá, uma espécie de imã, não estava só no querer dela, embora sentisse sim sempre vontade de estar ali.
  Pouco tempo após a saída da fazenda, já estava na porta daquela casa, ou melhor, no portão que dava acesso ao quintal, Diana percebeu então, estava novamente na casa de mãe de Joana.
  Antes que pensasse em chamar, mãe Joana já estava na porta, com aquele olhar de baixo para cima,  e um sorriso meio torto, convidou a moça para entrar, pelo olhar de mãe Joana, parecia que a mesma já sabia que seria visitada aquela tarde por Diana. E era este olhar que instigava cada vez mais uma ressabiamento de Diana.
- Venha, entre minha filha, pensei que não vinha mais, oh, que coisa, é claro que viria.
Diana permanecia calada, e agora olhava Joana de um modo que demonstrava medo, mas entrou, a atração era cada vez maior.
- Pode entrar menina, não tenha medo, venha, chegue até a minha cozinha. Minha cozinha é meu lugar preferido desta casa.
- Está bem, mas não devo demorar.
- Você nunca demora...
- Sempre tenho muita coisa para fazer, muito trabalho.
- Besteira, pra que trabalhar tanto, venha conversar comigo, venha perguntar o que você veio perguntar.
- Como assim? Perguntar? Eu não tenho perguntas.
- Deixa de se fazer de boba, eu sei bem que precisa falar comigo, senão não estaria aqui.
- Já disse que não tenho perguntas mas se a senhora insiste.
- Sente-se então.
  Diana sentou, e avistou ainda os estilhaços de algumas pétalas da rosa ao chão.
- Bonitas, flores, mas despedaçadas. O que ocorreu com elas?
- As minhas rosas? Ah as minhas rosas, minhas companheiras. Normal, vivem brincando, caem pelo chão, eu as apanho. Mas não adianta.
- Não entendo.
- O que você não entende?
- Rosas, brincando, companhia?
- Ah minha filha, você ainda tem muito que aprender, mas está certa, minhas rosas não brincam, elas são bem sérias.
- A senhora deve realmente gostar muito de flores, e deve se sentir bem sozinha também.
- Eu sozinha? Eu não recebo muitas visitas, e gosto muito das visitas, e gosto muito das flores, e principalmente das rosas. E principalmente da rosa.
 - Mãe Joana, posso perguntar-lhe uma coisa?
- Claro, enfim fará a pergunta...
- As vezes a senhora fala umas coisas tão esquisitas, que eu não entendo, tem horas que parece saber o que acontece, mas mistura com um mundo surreal. Não acredito muito nestas coisas, mas a senhora é envolvida por um tipo de magia?
- Direta menina, muito direta, não é a primeira pessoa que me pergunta isto.
- Mas é? Ou pelo menos se considera?
- Digamos que sou uma pessoa bem vivida, com idade bastante para ter um pensamento que vai além da realidade. Sou uma senhora que vive só, mentira, que vive muito bem acompanhada da solidão, e do meu roseiral.
- Está bem, não entendi muito, mas tudo bem...
- Talvez um dia você entenda. Está vendo aquele roseiral?
- Claro, tens belas flores.
- Pois é, está sempre florido. Sempre florido. Mas um dia ele vai parar de florir.
- Não, mas isso vai demorar muito, ela ainda vai te fazer muita companhia.
- Não, não quero que demore muito, já estou ansiosa para que ela pare de florir.
- Mas porque?
-  Faz séculos que aguardo este dia.
- Séculos, como assim séculos?
- Eu disse séculos? Não quis dizer anos. Mas vamos parar de falar nisso, já estou com a cabeça começando a doer.
- A senhora sempre reclama de dores na cabeça. Quer que eu a leve em um médico?
- Não. Não precisa.
- Claro que não, mas talvez se trouxesse meu noivo aqui, ele pode te ajudar.
- Seu amor? A não, ele está muito longe.
- Não, não está, esta a poucos quilômetros daqui...
- Não , está longe.
  Depois disso Mãe Joana saiu e deixou Diana ali sozinha, que acabou deixando aquela casa. Agora já não estava com tanta agonia, se sentia leve, tranquila, mas uma última coisa a instigou, ao sair da casa, ao passar pela roseira, está apresentava-se com as folhagens molhadas, e brilhavam muito. Poderia ser que Mãe Joana tivesse a aguado, mas aquele brilho chamou muita atenção, tanta que ela foi até a roseira e passou a mão em algumas das folhas “molhadas”, mas elas estavam perfeitamente enxutas. E ao se afastar delas, percebia agora em vez de brilho, o ofuscar da poeira sobre as folhas.

  Agora teve pressa de sair dali, sentiu um arrepio, pegou seu cavalo, e cavalgou, não com a vagareza que estava acostumada, mas num galope fora do comum. Pouco tempo depois já estava longe o bastante.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

CAPITULO XXII

CAPITULO XXII
  Toda aquela história deixou Julio um pouco intrigado, aquele rosto tão delicado, tão pálido sobre aquele catre, o causava sentimento de pena, e não era para sentir pena? Uma mulher que certamente tão jovem era. Saíram daquele quarto, e posteriormente daquela casa, não sabia por que motivo, mas Julio agora se sentia incomodado em estar com Diana, incomodado? Isto mesmo, sentia algo estranho, e mais do que isso se sentia muito estranho.
   Dona Joana preparava um café, como de costume buscara seu buquê de flores para enfeitar a mesa, sobre aquela mesa, a mesma vasilha de sempre, e daquela rosa vermelha, de um vermelho bem vivo, era tratada com muito carinho, com muito temor.  Escolhera aquela como sempre escolhia a melhor das melhores, tinha acabado de desabrochar, estava firme, mas toda firmeza acabara quando caíra sobre aquela poça d´água sobre a vasilha. Despedaçou a pobre rosa, aquelas pétalas se afastavam, e como se afastavam, o olhar de mãe Joana continuava fixo sobre aqueles estilhaços de pétalas. Mais uma vez, e se afastava, mas por quê? Já não era hora de se juntarem? Já não havia passado tempo de mais? Não seria obra do destino? A isso se ela ainda conseguisse acreditar em destino; não era se seu feitio aguardar por um destino.
   Mas que destino era esse que Mãe Joana tanto esperava? Ninguém se arriscaria a dizer, mas a rosa nunca mentia, com todo sua demonstração, com toda sua mística aparência. Era inútil, o que deveria era contentar-se com a informação indesejada, voltar a seu café, e quem sabe em outra ocasião teria a resposta que tanto procurava. Teria enfim o regresso.
  Dona Margarida e Jorge já estavam a caminho do sítio, com a vergonha que passara em frente a genro, em frente ao cunhado, não restara muito a não ser voltar para sua vida monótona do sítio, voltar e ver aquela dissimulada que chamava de filha, ver aquela que não dava valor sequer na coragem, à disposição, àquela que não tinha uma coisa tão fundamental chamada vergonha na cara. Mas vergonho isso Dona Margarida já tinha que sobrasse.
  Jorge permanecia calado, como sempre, observador não tinha muito que dizer consolar a mãe? Não, era inútil, dizer o que? Não podia defender a irmã, não queria isso. E dona Margarida, também não tinha coragem sequer de olhar na cara do filho, não tinha coragem de olhar na cara de ninguém, enquanto na rua nem cumprimentaram aqueles que cruzaram seu caminho. Durante o percurso da cidade até o sítio,  não minto dizendo que ela pensava no que fazer perante a situação, até porque ela não conseguia pensar em outra coisa senão a vergonha passada em ouvir tais palavras. Continuaram a viagem.
  Dalila não sentia muita coisa, não era acostumada a sentir remorso, na verdade cansou de fingir ser uma boa mulher, pelo menos para o marido, embora tivesse sido descoberta de modo tão escroto. Preferia dizer que ele era violento, era melhor para ela se fazer de vítima, ninguém precisava saber que ela era daquele jeito, principalmente Hanz, e ela decerto faria de tudo para esconder daquele homem a espécie de mulher que era, ele, no entanto não fazia tão diferente, Dalila não precisava saber que ele não deixava de ser um assassino, foragido talvez até da polícia. Ou pior, Dalila não precisava saber que ele era um nada, sem ninguém. E entre esses dois surgia um sentimento, um sentimento verdadeiro? Acredito duvidando, a verdade não era bem a palavra que se findava na construção de cada um destes personagens.
  Mas era melhore acabar com aquela melação de casal adolescente, digamos que não era a melhor hora para contar a Dona Margarida que estavam juntos, ela não entenderia. Ele foi para o estábulo, não antes de ser arrebatado por um beijo ardente de Dalila, que logo fora para cozinha fazer as vezes de boa moça dona de casa, e ajudante da mãe.
Ajudante esta que a mãe nunca quis, ajudante esta que era não mais que um inconveniente ali.
Logo a mãe chegara naquele casa, entrou sem nada dizer, e quando Dalila veio pergunta-lhe o que fora fazer tão cedo, a mãe não se ocupou em sequer dar uma resposta filha, a mesma foi para o quarto e passou o dia ali, sozinha, pensando, repensando.
  Dalila foi atrás de Jorge, que certamente diria algo sobre o porquê da mãe está tão desconsolada.
- Como assim Dalila? O porquê de mamãe está tão desconsolada? Você sabe melhor do que eu.
- Não entendo, disse a nossa vítima
- Dalila, comigo não precisa mentir, eu te conheço, eu sei do seu jeito, a gente nunca teve segredos.
- Segredos? Realmente maninho, a gente sempre foi muito ligado, você sempre me deu cobertura, mas desta vez não sei por que a mamãe pode estar deste jeito.
- Não? Vou te dar uma dica, fomos à casa de Johan hoje, ou deveria dizer sua antiga residência?
- Aquele ordinário, inventou horrores sobre mim...
- Inventou? Você tem certeza que ele inventou Dalila?
- Para mamãe ter me voltado tão revoltada, só pode ter escutado um monte de mentiras.
- Mentiras? Eu sei que não é mentira, e você sabe que não é mentira.
- Não vou discutir com você Jorginho...
- Não vou te dar nem resposta, você sabe que eu detesto este apelido.

Dalila deu não mais que um sorriso, e não parecia estar muito preocupada com a mãe, nunca se preocupou, não seria agora que começaria a se preocupar. Jorge foi estar com Hanz, mas preferiu não comentar nada sobre a irmã.